2007-07-31

Literacia e longevidade

De acordo com um artigo publicado no NYTimes e assinado por Eric Nagourney, a competência linguística, nomeadamente a competência de ler e interpretar informações médicas básicas, aumenta consideravelmente a longevidade, verificando-se em vários estudos que existe uma maior mortalidade entre os pacientes menos letrados.
Segundo um estudo, em que se verificou que pessoas que não tinham completado a "high school" viviam em média menos 9 anos do que os que se tinham graduado, tal facto pode ficar a dever-se a que mais educação se reflecte normalmente em melhores empregos, melhor habitação, melhor alimentação e melhores cuidados de saúde.

Sabendo que em Portugal as despesas com a Saúde e com a Educação constituem um pesado encargo para o contribuinte que não consegue fugir aos impostos, o desperdício de recursos financeiros e humanos que resulta da exclusão e abandono escolar é provavelmente responsável pelos elevados custos que se registam também no SNS.

O PS e (é) a Nova Direita conservadora

Uns dos problemas com que os governos europeus, em particular os pertencentes à UE, se têm debatido nos últimos anos, tem a ver com as crescentes dificuldades do Estado-providência e a (re)emergência dos valores liberais do mercado.
A forma como o problema tem vindo a ser resolvido na maior parte dos países, tanto por governos de esquerda, como por governos de direita, aponta para uma espécie de "dois em um", na qual se procura fazer uma espécie de quadratura do círculo, tentando compatibilizar os valores do Estado social com os valores do mercado.
Para o conseguir todos os governos tiveram que recorrer a um conjunto de estratégias, que sendo comuns, determinam uma aproximação política que acaba por dificultar a clarificação ideológica entre partidos que se reclamam de áreas distintas.
Entre essas estratégias é possível identificar as seguintes: ou se tenta redefinir o que se entende por direitos ligados ao Estado-providência (uma questão essencialmente ideológica), ou se consegue um melhor equilíbrio entre a oferta e a procura (com uma maior eficiência na utilização das receitas provenientes dos impostos) ou, ainda, se encontram fontes alternativas de financiamento.
  • No primeiro caso é preciso convencer os cidadãos a reduzir os seus direitos, ou no mínimo a não os aumentar;
  • No segundo caso deve procurar-se um reencaminhamento da procura para o sector privado, criando estímulos para o desenvolvimento deste sector e convencendo os cidadãos de que não perdem direitos, uma vez que acederão a "serviços de melhor qualidade";
  • No terceiro caso, o que se pretende é atenuar as diferenças entre público e privado, de forma a tornar menos perceptível a distinção entre direitos sociais e individuais, enfraquecendo os valores do Estado-providência.
Segundo A.J.Afonso num artigo publicado na revista Educação e Sociedade, em Dezembro de 1999, sob o título "Estado mercado e avaliação", «Foram precisamente algumas dessas estratégias, implementadas pela nova direita, que configuraram o que alguns autores têm vindo a designar como mecanismos de quase-mercado.»
Curiosamente, olhando para a acção do governo do PS liderado por José Sócrates, encontramos todas as estratégias usadas em conjunto, o que se por um lado permite afirmar que o governo do PS é a Nova Direita, por outro ajuda a explicar as enormes dificuldades porque passam os partidos da oposição à direita do PS, ao mesmo tempo que os sinais de incomodidade com a situação aparecem na "ala esquerda" do PS e a oposição de esquerda mantém intacta a sua credibilidade.

2007-07-30

Privatização do ensino básico

Quando falamos de privatização do ensino básico, a primeira ideia que nos surge é de que se está a falar de colégios particulares, sejam eles geridos por empresários, por instituições religiosas ou por cooperativas de ensino.
No entanto, as questões que se prendem com a privatização do ensino, ou dito de outra forma, com o financiamento do serviço público de educação, estão muito para lá dessa controvérsia "escola pública vs colégio privado".
A presidente de um conselho executivo de uma escola pública que, pelas posições publicamente assumidas até hoje, me parece insuspeita de defender a "privatização" do ensino, faz hoje declarações ao jornal o Público que são música para os ouvidos dos liberais que advogam a "escolha da escola", como por exemplo o Fórum para a Liberdade de Educação
É que o problema fundamental da escola pública tem que ver, sobretudo, com o seu financiamento. Ou esse financiamento é feito directamente pelo Estado, através dos impostos cobrados, ou é feito pelas famílias através das propinas e outras taxas. Quem defende um serviço público de educação, obrigatório e universal, não pode nem deve defender a cobrança de taxas e propinas que correspondam a uma contribuição das famílias, negando-lhes ao mesmo tempo o direito à intervenção na regulação do serviço, através da escolha da escola e da participação nas decisões sobre o seu quotidiano.

2007-07-29

Charrua, carreirismo e cidadania

O caso do prof. Charrua, da directora da DREN e das posições políticas do Governo, da Ministra da Educação e do PS-Porto já causam nausea.

Antes de mais tenho que declarar que nem conheço o prof. Charrua, nem simpatizo com nenhum dos muitos charruas que, graças à filiação partidária e à simpatia política, trocaram uma vida de profissionais do ensino, trabalhando na escola com os alunos e os outros professores, por uma carreira burocrática, muitas vezes infernizando a vida de quem no quotidiano escolar tenta levar o barco a bom porto.

Dito isto, tenho que lamentar que num país democrático, que no início do séc XXI preside a uma organização democrática - UE, seja possível que o partido que sustenta o governo possa produzir gente como Margarida Moreira e Renato Sampaio, que a coberto da complacência da Ministra da Educação e do 1º Ministro, continuam a promover um espírito de denúncia e perseguição política.

Na verdade, a decisão tomada pela Drª Mª Lurdes Rodrigues de arquivar o processo Charrua, alegando motivos políticos que na sua óptica se sobrepõem à esfera disciplinar, na qual terá alegadamente ficado provada a culpa do arguido, acaba por dar razão e força à posição de Margarida Moreira e Renato Sampaio.
O despacho de arquivamento, resolvendo a questão política de "não punir a liberdade de expressão", deixa ficar uma condenação moral sobre um alegado insulto ao 1º ministro.
Resta saber que prova foi produzida no âmbito do processo. Quem foram as testemunhas de acusação e qual o seu grau de dependência (e já agora do medo de que fala Manuel Alegre) em relação à directora regional e ao presidente da distrital do Porto do PS? Será que se essas testemunhas tivessem testemunhado em sentido diferente não veriam a sua "prestação de serviços" na DREN terminada, ou não renovada? Afinal onde é que acaba a "confiança política" para esta gente?
E que dizer do instrutor do processo? Que relações políticas, profissionais e partidárias existem entre este jurista e Margarida Moreira e Renato Sampaio?

Porque é que os partidos políticos, em particular os que ocupam o poder desde há trinta anos, não se decidem a despartidarizar por completo a administração pública. Quando é que os chamados "partidos do arco governativo" deixam de olhar para os lugares da administração e para os funcionários públicos que lá trabalham como uma coutada sua?
E os cidadãos que somos todos nós, até quando vamos continuar a aceitar este estado de coisas sem protestar?

A Escola e "qualidade" da educação

A Escola pública de massas é uma "invenção" intrinsecamente ligada à revolução industrial e uma resposta dos Estados-Nação à necessidade de, por um lado facilitar o desenvolvimento da sociedade industrializada, e por outro assumir a tarefa de educar todas as crianças e jovens. Esta era uma tarefa que o Estado não podia confiar às famílias, nomeadamente as de recursos económicos mais baixos, que viam os seus filhos como força de trabalho e fonte de rendimento.
A segunda metade do séc. XX e em particular os anos que se seguiram à II guerra mundial, foram anos de grande desenvolvimento e sucesso desta escola de massas, garantindo às famílias, sobretudo às das classes médias a mobilidade social a que aspiravam.
É desta Escola que normalmente falamos, ou ouvimos falar, quando estão em causa as comparações com a actual Escola pública e as diversas abordagens que são feitas à sua "qualidade" ou falta dela.
Esquecemos, ou melhor ignoramos, que foi exactamente o sucesso da Escola de massas no seu objectivo de alargamento da escolaridade a todas as crianças, que se transformou num entrave a um objectivo que era da escola tradicional, e que é incompatível com essa "universalização do ensino": a função de certificação e estratificação social.
É por isso que entre os maiores defensores da "elevação dos níveis de exigência" e da "qualidade dos resultados escolares", encontramos os representantes das classes médias. Pelo mesmo motivo, no debate sobre a "qualidade" da escola apenas se fala dos resultados, da necessidade de mais exames e mais certificação, menosprezando-se os aspectos relacionados com os processos de ensino e aprendizagem, as condições de trabalho das comunidades escolares, ou a avaliação dos percursos de aprendizagem realizados por cada aluno dentro da escola.
Elaborar e publicitar "rankings" escolares, exclusivamente com base nos resultados de exames externos, não permite identificar as aprendizagens feitas pelos alunos fora da escola, com recurso a ajudas externas como explicações, acesso a bens culturais promovidos pelas famílias e outras vantagens não creditáveis à escola.

2007-07-28

Como é possível???

Passeando pela blogosfera podemos encontrar verdadeiras pérolas, que nos deixam mais atordoados do que se tivéssemos bebido um pouco para lá do razoável.
A última que encontrei, e que de alguma forma se entronca na confusão "partidário-ideológico-conceptual", que tudo mistura neste Portugal do início do séc. XXI, é a seguinte:
«Monárquico e Católico. intransigente defensor do papel interventor do Estado na sociedade. Adversário dos anticlericais saudosos da I República, e de "alternativos" defensores de teses “fracturantes".» (perfil de um bloguer assumidamente conservador)
Monárquico e católico é perfeitamente aceitável. Tão aceitável como monárquico e protestante, monárquico e ortodoxo ou até republicano e adventista, ou mormon, ou qualquer outra religião.
Agora, quando subjacente à ideia de monárquico e católico parece estar a ideia de rejeição do socialismo, do comunismo ou de ideologias normalmente associadas à esquerda e ao predomínio do papel do Estado sobre o Indivíduo, torna-se verdadeiramente risível que um opositor dos princípios socialistas se declare intransigente defensor do Estado.
Claro que, pensando bem, em Portugal terra de Stª Maria, esta posição não tem nada de risível, sendo pelo contrário a posição normal. Tanto que Sócrates, um produto perfeito do Portugal profundo (ultramontano e beirão), usando o discurso do socialismo rosa vai fortalecendo o estado, com o beneplácito da maioria do Portugal católico e reverente!

Particularidades da "Política à Portuguesa"

Quem tem memória dos idos de 74/75 e da generosidade e ingenuidade dos tempos do "prec", lembrar-se-á de que, na altura da fundação da nossa democracia, nenhum partido queria ocupar o espaço da direita. É verdade que havia um tal de PDC e mais algumas tentativas residuais de afirmação "direitista", mas o mercado eleitoral da altura não era propício a esse tipo de devaneios. A tal ponto que o CDS, fundado por Freitas do Amaral e Adelino Amaro da Costa, se apresentava como um "partido rigorosamente do centro"!
De tal forma eram as coisas que a Assembleia Constituinte acabou por ser eleita, de forma esmagadoramente maioritária, com partidos que se reclamavam da esquerda ou do centro esquerda, não tendo um único deputado que defendesse abertamente políticas de direita.
Os anos foram passando (já levamos três décadas de democracia parlamentar) e aos poucos o barco tem vindo a adornar claramente para a direita. A tal ponto, que mantendo-se 4 dos 5 partidos com representação parlamentar dessa primeira Assembleia, hoje apenas um continua a defender políticas que se podem associar a um pensamento de esquerda.
Hoje vemos o CDS/PP transformado num pequeno grupúsculo, liderado por um autêntico "cata-vento", que tendo filiados uns quantos liberais genuínos, apresenta um discurso profundamente conservador, populista e demagógico; Vemos um PPD/PSD desorientado porque o PS lhe "usurpou" o discurso "social-democrata" e as práticas neo-liberais, o que determina que o seu líder tenha que usar um discurso liberal, tentando parecer mais defensor do estado social do que o seu concorrente.
Confuso? Então para ajudar à confusão, constate-se que o PS que governa, apresentou um programa "social-democrata", ao mesmo tempo que aplica o receituário da modernidade, da eficiência, da eficácia e da defesa dos valores do mercado, que traduzem no essencial o ideário da direita liberal!!!

Será que não existe solução para toda esta embrulhada partidário-conceptual? Alguns dos "pensadores" que se reclamam de direita (sobretudo os que ou já militam, ou pelo menos gravitam em torno do PS) sugerem a fusão do CDS/PP com o PPD/PSD.
Por mim acho curto e de resto não me parece que seja clarificador. Talvez uma "fusão a três" para construir dois fosse mais aconselhável. Ou seja: pegar no PP, no PSD e no PS que se reconhece em Sócrates, fazendo destes um partido conservador e um partido liberal. Do que restar do PS, a que se poderão juntar alguns PSD's genuinamente social-democratas, construir um partido social-democrata no ideário e nas práticas políticas.

2007-07-26

O "bem público" e a pressão privatizadora II

O discurso tantas vezes usado de "menos Estado, melhor Estado", normalmente associado às correntes liberalizadoras da sociedade, é utilizado indiscriminadamente por "neo-liberais", "neo-conservadores" e "socialistas da 3ª via".
Como em relação a qualquer outro conceito, cada um apropria-se das palavras, dando-lhes o significado que melhor serve os seus interesses.
No caso particular da Educação, os auto-proclamados partidos do "arco-governativo" estão totalmente de acordo com a retórica do "menos Estado, melhor Estado". A questão é saber qual o significado prático que esta divisa tem, ao ser posta em prática por cada um dos partidos.
Na área mais à direita, a que correspondem o PSD e o moribundo PP, a clarificação entre "neo-liberais" e "neo-conservadores" está por fazer, uma vez que ambas as correntes estão representadas nos dois partidos. Já quanto ao PS, dirigido por adeptos de correntes liberais da 3ª via, balança muitas vezes entre posições neo-liberais defensoras do mercado e posições mais próximas de um autoritarismo neo-conservador, claramente defensoras de uma intervenção reguladora dependente de um Estado forte.
Assim, ouvimos de um lado Marques Mendes reclamar mudanças radicais na organização e gestão das escolas públicas, aproximando-se das reivindicações dos defensores da "livre escolha da escola" e do "cheque-ensino". Por outro lado, ouvimos Paulo Portas clamar por maior intervenção do Estado, através da introdução de mais exames nacionais, necessariamente mais constrangedores de ideias de currículos diversificados, pela sua clara intenção de promover a elitização do sistema. Finalmente, Sócrates utiliza a ideia da autonomia e da contratualização para diminuir o tamanho do Estado central, ao mesmo tempo que acentua a necessidade da avaliação e da prestação de contas, reservando ao Estado o papel central na regulação do sistema, quer através do controlo do currículo, quer através dos mecanismos de avaliação externa, de que os exames nacionais são apenas uma parte.

2007-07-25

O "bem público" e a pressão privatizadora I

Nos últimos anos temos vindo a assistir a uma mudança de paradigma na gestão da "coisa pública", a qual se acentuou claramente desde que a maioria Sócrates chegou ao poder.
Para esta geração de políticos, militem no PS, no PSD ou no PP, o modelo a seguir é o das chamadas "boas práticas" difundidas através das diversas agências internacionais, sejam elas a UE, a OCDE, o Banco Mundial ou outra qualquer.
E, segundo nos dizem aqueles que se fazem eleger para nos governar, o futuro está na privatização do "bem público", sob o pretexto de que o sector privado é mais eficiente e consegue gerir com maior eficácia do que o Estado, o que se traduzirá em níveis de maior qualidade do serviço prestado.
Mas, por baixo da superfície, a esta diminuição do tamanho do Estado não corresponde uma diminuição do seu poder. Pelo contrário, embora entregando a gestão dos bens públicos (seja a Saúde, a Educação, a Distribuição da Água ou da Electricidade) a empresas privadas, na verdade o Estado mantém um controlo absoluto e muitas vezes até aumentado, através de sistemas de monitorização e avaliação que fazem parte do pacote de contratualização da prestação do serviço público por parte das entidades privadas.

Os caminhos que se vão percorrendo na Educação, seja ao nível do Ensino Superior com a introdução de novas formas de gestão e o recurso a Fundações, seja no Ensino Básico e Secundário com o acelerar dos processos de Avaliação Externa e a pressão para a definição de regimes de contratualização, são um passo claro no sentido da transferência de responsabilidades do Estado central para novos centros de regulação das políticas públicas de educação.
Se por um lado vamos ouvindo algumas vozes liberais pregarem o primado das famílias na escolha da escola, ao mesmo tempo que outras vozes nos agitam o papão do "voucher", as políticas que estão a ser aplicadas pelo actual governo apontam antes para um modelo de Estado-avaliador, que vai muito mais no sentido da criação de "charter schools" .
(continua)

Arquive-se!

Com este despacho a Drª Lurdes apresenta-se ao país como uma paladina da Liberdade, na senda dos "fundadores" do PS, imaginando que somos todos uns papalvos, sempre dispostos a comer e calar.
De resto, é por conhecer demasiado bem a propensão dos portugueses para "tratarem da sua vidinha" e assobiarem para o lado, quando estão em causa temas de cidadania, que a actual nomenklatura, que domina o partido da maioria, utiliza os truques e as golpadas que serviram ao seminarista de Stª Comba para governar até morrer.
A Drª Lurdes mandou arquivar o processo do professor Charrua, mas nem ao de leve criticou a Drª Margarida, ou verberou a atitude do bufo que o originou.
A Drª Lurdes diz que o despacho evita que um português seja punido por um delito de opinião, mas não mandou reintegrar o professor Charrua, mantendo na prática a punição de fim da requisição na DREN, que vigora desde que a suspensão preventiva, no âmbito do processo agora arquivado, foi revogada.
E no meio disto tudo, ainda temos que levar com a "cara de pau" do porta voz do PS, a dizer que a atitude da ministra (claramente pressionada por toda a opinião pública e publicada) demonstra que o PS é um partido de liberdades!!! Isso foi chão que já deu uvas, mas há tanto tempo que muita gente nem se lembra.

Fim de um ciclo, início de outro...

Mais uma volta, mais uma corriiiiiiiiiiddddddddaaaaaaaaaaaa...
Este era o pregão que em miúdos nos prendia aos divertimentos da feira: o carrocel, os carrinhos de choque e tantos, tantos outros que nos transportavam para mundos mágicos.
E afinal tudo se repete... Os anos passados, a meninice já longínqua, mas a roda da vida continua a avançar inexoravelmente a cada ciclo, a cada volta, a cada recomeço.
Neste final de Julho é tempo de balanço de um ano antes das férias e é tempo de antevisão de um ano depois das férias.
E se o conceito de férias for um pouco mais restrito do que a pausa entre dois períodos de trabalho, centrando-se no sentido dado às férias escolares, em particular às nossas antigas "férias grandes", então o sentido do balanço e prospectiva ganha outra dimensão.
Para os professores este ano que passou foi um tempo de grandes convulsões:
Foi o tempo de um novo estatuto que fractura a carreira e introduz divisão e mal estar entre gente que tem que trabalhar em equipa, com vista a produzir um trabalho mais eficiente, com maior qualidade e eficácia, para que seja uma efectiva mais valia para a sociedade.
Foi o tempo de um concurso para professor-titular, que para além da divisão entre colegas, constitui o mais perfeito exemplo da opacidade, da prepotência e do desrespeito pelos direitos dos professores que concorreram, já que o acesso à informação foi reservado a uns quantos "eleitos", a quem tudo foi permitido sem serem sujeitos ao escrutínio das decisões que tomaram.
Tal como foi o tempo de anúncios pomposos sobre a aplicação do "choque tecnológico" às escolas, como corolário de um tempo de propaganda.
Ao mesmo tempo que aconteceram processos disciplinares iniciados com denúncias que fazem relembrar o tempo dos bufos das pides, dos kgb's e outras "instituições de repressão e controlo" ao serviço de governantes que não mereciam governar.
Foi ainda o tempo de reformas como a "TLEBS" que esteve em vigor e deixou de estar, que tem grandes defensores, mas também grandes adversários e detractores e que tanto pode vir a ressuscitar, como pode ficar morta e enterrada, tudo dependendo da vontade política de quem tem poder para decidir.

E é sobre essa questão que procurarei centrar as intervenções e as mensagens que aqui escrever: sobre quem tem o poder de decidir em termos de políticas públicas. Ou dito de outra forma, como e por quem é feita a regulação das políticas que a todos afectam.
Será que temos que nos conformar à decisão dos governantes que temos? Será que são os técnicos e os putativos sábios que aconselham os governantes que têm o poder decisório? Ou, pelo contrário, ainda existe um espaço para o exercício da cidadania?
E de que forma é que a regulação cidadã das políticas públicas se pode exercer?
Bastar-nos-á participar nos "fóruns TSF" ou "fóruns SIC-Notícias", para dizendo meia dúzia de banalidades, fundadas num senso comum que as mais das vezes tem mais de comum do que de senso, para exercer o direito de cidadania e de regulação inerente à condição de eleitor responsável?
Ou a participação deverá implicar um exercício de reflexão prévia, para que o debate e o contributo individual passe a ser verdadeiramente respeitado e tenha consequências para os decisores políticos?
Tentarei, neste espaço, dar um pequeno contributo para a reflexão sobre temas que, para além do interesse particular que me despertam, podem e devem estar na ordem do dia, muito embora nem sempre estejam na agenda mediática, ou seja do interesse dos governantes que sejam debatidos.
E a educação, a escola pública, a eficiência e a eficácia das escolas, os contratos de autonomia ou a privatização, são sem dúvida temas que merecem reflexão, debate e procura de clarificações que permitam um entendimento mínimo em direcção a um futuro melhor para as crianças e jovens deste país.
Num mundo em que tudo parece decidido,
ainda há espaço
para o exercício de um pensamento cidadão