2008-02-25

Avaliação de Professores

Sobre a necessidade de avaliação dos professores há um consenso geral na sociedade portuguesa. Com um pouco de optimismo, pode até pensar-se que todos os portugueses acham necessária a avaliação dos professores.
Os professores portugueses fazem parte desse todo e há muito que sabem que não podem deixar de ser avaliados.

Há muitos anos que muitos professores reclamam pela existência de um sistema de avaliação que, para além de ter que ser justo e equilibrado, introduza factores de melhoria na qualidade do ensino. Por isso a maior parte dos professores não se revia no modelo de avaliação que estava em vigor, já que era um modelo acrítico e que não introduzia os tais factores de melhoria do serviço público educativo.
Infelizmente também o modelo agora em vigor, aprovado pelo DR 2/2008, é um modelo que não traz para o sistema educativo o acréscimo de qualidade educativa que se pode imaginar ao ouvir a retórica governamental. Por isso também não serve.

Neste ponto pode haver quem se questione: mas afinal nenhum modelo serve?!

Comecemos por ver porque é que cada um destes dois modelos não serve.
No caso do regime anterior a avaliação dependia exclusivamente da capacidade reflexiva e autocrítica do professor avaliado e da frequência de algumas acções de formação contínua que, mais do que para actualizar conhecimentos e práticas pedagógicas, servia para alimentar o negócio dos centros de formação. Nestas coisas, como em tudo na vida, havia directores de centros de formação muito honestos e exigentes e havia outros que ou eram incompetentes ou meros oportunistas. No primeiro caso as acções de formação serviam de facto para aperfeiçoar o trabalho lectivo dos docentes que as frequentavam, no segundo caso serviam apenas para progredir na carreira.
Apesar de não garantir uma efectiva melhoria do trabalho dos professores, o modelo anterior preservava no entanto um aspecto fundamental na vida das organizações escolares - o trabalho cooperativo entre docentes. Tal facto ficava a dever-se à circunstância de nenhum professor ver nos seus pares um concorrente e um impedimento à sua própria progressão na carreira.

No caso do modelo definido pelo DR 2/2008 pode verificar-se que houve uma tentativa de correcção do excessivo pendor auto-gestionário anterior, introduzindo para isso dois avaliadores externos (o coordenador e o presidente/director). Se a introdução desses elementos no processo pode ser pacífica, já a complexificação associada ao conjunto de parâmetros e objectivos a observar, acabam por trazer para o quotidiano escolar uma perturbação que não beneficia em nada o trabalho na sala de aula.
Se a este problema juntarmos ainda a questão das percentagens máximas de menções de muito bom e excelente, as quais influenciam o ritmo da progressão na carreira, deparamo-nos com um factor de concorrência entre pares, o qual acabará por prejudicar o trabalho cooperativo que é fundamental para um bom processo de ensino.

Resumindo, os professores querem um sistema de avaliação que os ajude a ensinar melhor, que permita que os alunos aprendam mais e melhor e que dignifique o ofício.
Mas como os professores não fazem o seu trabalho isoladamente e num ambiente virtual, exigem que a sua avaliação seja parte integrante da avaliação da organização a que pertencem. É preciso avaliar a organização no seu todo: os seus processos e os seus resultados. Sem conhecer os processos como as lideranças gerem os recursos humanos e materiais, os fluxos de informação,
as relações com o exterior da escola, não é possível definir metas e objectivos que sejam claros para os professores, para os funcionários e para os alunos.
Desse ponto de vista um bom modelo de avaliação de professores é um modelo que faça parte integrante da avaliação da escola. É um modelo que tem que ser essencialmente formativo e só acessoriamente pode ser constrangedor do desenvolvimento da carreira.

Se o País quer ter um Ensino Público de Qualidade, se quer que os cidadãos sejam formados para a excelência e para padrões de referência que permitam competir no exterior, é ridículo que o governo se conforme em não ter professores muito bons e excelentes. É inadmissível que a ministra da Educação defina à partida que quer ter 70% de professores que não passam da mediania.

Tudo isto é demasiado pobre e triste!

2 comentários:

Manuel Rocha disse...

Caro F Santos,

Segui-lhe o rasto do comentário que deixou no Ciberdemocracia.

Estive a lé-lo e do que li não encontro razões que resolvam a aparenta contradição que aponta entre a critica á classe ( professores ) e á politicas de educação ( que não são apenas perrogativa do Ministério ).

Neste post em particular subscrevo a sua linha de raciocinio e portanto seria naturalmente levado a subscrever também a sua conclusão, mas com a ressalva de que é ainda mais inadmissivel que os professores e as suas associações tenham convivido tantos anos com essa incongruência que teve como resultado óbvio a mediocratização de todo o sistema. Esse acomodar corporativo teve como consequência uma fragilização moral que lhes retira agora, naturalmente, credibilidade.

Além disso há a má educação e a deselegãncia. Muitas vezes não basta ter razão, é preciso demonstra-la com argumentos válidos de forma incisiva, claro, mas educada. A menos que o temperamento acintoso vise apenas disfarçar a insuficiência dos argumentos....:((

FranciscoSantos disse...

Caro Manuel Rocha,
O problema está nas generalizações. São sempre injustas, umas vezes mais, outras menos.
Esclarecendo:
desde que iniciei a minha carreira (na verdade já antes) fui submetido a uma avaliação permanente por parte dos meus alunos, dos respectivos encarregados de educação, pelos meus pares e pela tutela.
Essa avaliação, isto é, o juízo que esses milhares de pessoas fizeram sobre o meu trabalho ao longo de trinta anos, contribuiu certamente para que hoje seja melhor professor do que era quando comecei a leccionar. Da mesma forma tanto a minha auto-avaliação, como a formação e a actualização de conhecimentos ao longo da vida, me permitiram corrigir algumas insuficiências e superar dificuldades.

Nada disso tem a ver com classificações, com distinções e com prémios de desempenho.
A profissão docente desenvolve-se em cooperação com os colegas, em permanente partilha de experiências e conhecimentos.
Promover a caça ao prémio, associar a progressão na carreira a um processo que tem que ser formativo e ao mesmo tempo dar aos avaliadores a possibilidade de negarem aos avaliados o bem escasso que é uma classificação de excelência, que assim podem guardar para si, é promover a perversão do sistema.

Num mundo em que tudo parece decidido,
ainda há espaço
para o exercício de um pensamento cidadão