Das cerca de duas horas que durou a sessão poderão fazer-se diversas "leituras". Pessoalmente registei dois aspectos que me parecem ser os mais significativos:
- A verdadeira "conversa de surdos", que estando estabelecida há muito tempo entre o governo/PS e a oposição, esteve presente em todas as intervenções, de ambos os lados da "barricada";
- A singela explicação que a certa altura a ministra produziu (e que não foi explorada por nenhum deputado da oposição) de que, em defesa da administração, não é possível "tirar o tapete" aos dirigentes, mesmo quando se enganam e cometem erros.
De resto, nas intervenções feitas pelos quatro deputados do PS também não houve uma tentativa de explicar o que quer que fosse, limitando-se estes a tentar fazer passar a ideia de que se estava perante uma acção de diversão por parte de um partido "moribundo", e ignorando ostensivamente que todos os partidos da oposição expressavam as mesmas dúvidas e perplexidades que se colocam a toda a sociedade a propósito deste caso.
Em resultado disto, à pergunta sobre se é intenção do PS e do governo que os dirigentes da administração pública "eduquem" os comportamentos dos funcionários sob a sua tutela através de processos disciplinares, os questionados nada responderam, permitindo que o português médio pense que é o que se vai continuar a passar.
Quanto à afirmação da necessidade de defesa da hierarquia produzida pela ministra, não é de espantar ninguém. Num país com uma tradição altamente centralizadora, em que toda a gente desconfia do "caciquismo", "amiguismo" e outros "ismos" associados a sistemas descentralizados de exercício do poder (veja-se o resultado do referendo sobre a regionalização, ou o que o eleitor médio pensa da transferência de alguns serviços públicos para a tutela das autarquias), o modelo burocrático é fundamental para realizar as tarefas de governação.
O que é de espantar é que a ministra que há mais de dois anos anda a bradar contra a pretensa falta de qualidade do trabalho docente, não se incomode com a falta de qualidade dos dirigentes, desde que o respectivo lugar na cadeia hierárquica já os proteja da punição e da crítica pela prática de erros no exercício das suas funções.
Em conclusão parece ter ficado claro o seguinte:
- O processo disciplinar que foi aberto, tendo ou não (a ministra ontem falou na existência de dúvidas) motivações políticas, foi determinado por uma pessoa que exerce uma função política, que é a de gerir recursos numa direcção regional;
- Alegadamente o processo decorreu de forma correcta, de um ponto de vista processual/legal, tendo sido provada a culpa do arguido;
- O processo foi mandado arquivar, sem aplicação de uma pena material (mas com a aplicação de uma punição moral), por motivos de ponderação política;
- O arguido não pode, em sede de processo, recorrer da pena aplicada porque, por um lado não existe nenhuma pena material e pelo outro a condenação moral não é recorrível;
- Finalmente, tendo havido ponderação política no final do processo, prova-se que a responsável política pela gestão da direcção regional foi incompetente politicamente, ao não ter realizado essa ponderação em tempo útil, o que teria evitado todos os prejuízos políticos do caso. Estranha-se que essa incompetência não seja motivo de crítica pela parte da equipa dirigente do ministério, tão diligente nas críticas à falta de profissionalismo que encontra nos professores, esses sim o verdadeiro sustentáculo do sistema.
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